Imagino como deve ser boa a sensação de pegar uma obra deteriorada e recuperar sua identidade – ainda que mantenha as marcas do tempo. Esse é o trabalho da moradora de Santa Tereza, Rosangela Reis Costa, profissional da restauração, que usa sua habilidade e conhecimentos científicos na preservação de imagens da história e cultura do país.
Seu desejo de viver em Santa Tereza, que demorou um pouco a ser concretizado, veio da busca por qualidade de vida e pelo astral de cidade do interior, por ser perto do centro, pra ver céu, que transformou em amor pelo bairro, comenta ela.
A restauração entrou em sua vida em 1978, quando a adolescente Rosangela saiu de sua cidade, Barbacena e veio pra Belo Horizonte, em busca do sonho de estudar na Faculdade de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Logo, começou a estagiar no setor de restauração do Iepha (Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico). Gostou do que fez e passou a buscar outros estágios na área, enquanto cursava a faculdade.
“Trabalhei no Cecor (Centro de Preservação e Restauração de Bens Culturais da UFMG), além de ter prestado serviços em alguns espaços como igrejas barrocas e o Palácio da Liberdade. Mais tarde, depois de formada, voltei para o IEPHA, já como funcionária”, relembra ela.
Rosangela comenta que “minha história nessa área é longa e uma das coisas mais emocionantes foi trabalhar na limpeza e retirada de microorganismos dos profetas em Congonhas, na Basílica de Nosso Senhor do Matosinhos. Foi fantástico cuidar das obras de Aleijadinho. ”
Em 1987, Rosangela e quatro colegas de trabalho, em uma atitude ousada, deixaram o IEPHA e criaram o Grupo Oficina de Restauro, para trabalhar por conta própria naquilo que sabiam fazer de melhor: restauração de bens antigos, especialmente igrejas.
Rosangela fala com orgulho da Oficina de Restauro, que tem o lema “Conservar sem ser conservador”, é uma empresa de arte, cultura e restauração, que segundo ela, tem também a preocupação de valorizar os funcionários. “Tem muitos deles que estão com a gente há mais de 20 anos e há filhos de funcionários que acabaram por vir trabalhar conosco. Isso pra gente é muito importante”.
A Oficina por fazer muitos trabalhos no interior do estado, acaba formando mão de obra especializada no restauro. “Quando chegamos em uma cidade, precisamos contratar auxiliares, que muitas vezes se interessam e aprendem o ofício e seguem nessa profissão de restaurador. Dessa forma capacitamos jovens das cidades do interior para a preservação dos bens culturais”, observa ela.
Atualmente a Oficina de Restauro é formada por e Rosangela, Adriano Reis Ramos e Maria Regina Reis Ramos, que apesar do sobrenome igual (Reis) não são parentes, uma coincidência do destino.
Nesses 34 anos, trabalhando em conjunto, centenas de imagens, objetos, igrejas e imóveis foram recuperados por eles, que por força do ofício acabaram por expandir por outras áreas como pesquisas, desenvolvimento de técnicas, formação de mão de obra especializada, consultoria, montagem de exposições, embalagem e transporte de obras de arte, formação e treinamento.
Entre alguns desses bens recuperados estão o inventário dos bens móveis das igrejas barrocas de Santa Barbara, Caeté, Ouro Preto, restauração da fachada do Edifício Acaiaca, descupinização e recuperação do acervo do escritor Mário de Andrade, restauração do retábulo do coro da antiga matriz da Boa Viagem do Curral Del Rei– Igreja da Boa Viagem, além da restauração de móveis para particulares.
Enfim, a restauração, segundo Rosangela, é uma arte baseada na aplicação de método científico rigoroso e objetivo, para o qual são elaborados previamente análises, estudos e projetos, baseado na filosofia da intervenção com o mínimo sacrifício dos aspectos históricos e estéticos das obras.
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Um dos grandes trabalhos desse trio foi a restauração artística da Igreja São José, cartão postal, símbolo histórico e religioso de Belo Horizonte. Na época da restauração, muita gente se espantou em ver a igreja que era bege se transformar em um templo colorido e cheio de vida.
A responsável pela intervenção da Igreja são José foi a Maria Regina, com o apoio da Rosângela e do Adriano. Segundo Rosângela, o trabalho começou com a pintura no altar mor nos anos 80. “Aos poucos fomos restaurando outras partes e tomamos gosto pelo trabalho, principalmente a Maria Regina, a Marrege.
Ela passou a fazer pesquisas junto com os padres em diversos documentos existentes na biblioteca da igreja. Daí descobriram que as pinturas originais eram coloridas e decorativas, inclusive a marca da tinta que foi usada, que não era ideal para o exterior, por isso, a igreja foi pintada cobrindo a original”, observa Rosângela.
Depois do resgate desses dados históricos, em conjunto com Patrimônio Histórico e o apoio dos padres, chegou-se à essa decoração externa tão chocante realizada pelo Grupo Oficina de Restauro, que tem encantado quem passa pelo centro da cidade.
Foi um trabalho árduo, que levou anos para a recuperação total do templo, desde as pesquisas, a pintura original externa, a reprodução dos desenhos decorativos da época e da parte interna do templo. Mas valeu a pena, pois a igreja ficou como era na época da sua inauguração em 1902, pelos padres redentoristas holandeses, em estilo eclético de influência neo gótica.