Não existe dúvida de que o ocorrido com Luiza Brunet foi algo horrível. Algo que nenhuma pessoa deveria sofrer. Imagine decidir dividir sua vida com alguém, acreditar que encontrou um parceiro e, na verdade, estar mais sozinha do que antes.
O que aconteceu com Luiza Brunet deve ser colocado em contexto. Primeiro, no contexto da cultura machista em que vivemos. Mulher nenhuma está imune à violência de gênero. Nem mesmo as ricas, nem mesmo as brancas. Nem mesmo feministas. A violência de gênero, inclusa nela a violência doméstica, é parte estruturante do sistema de sociedade machista e patriarcal em que vivemos. Este sistema determina quais são os papeis aceitáveis na sociedade para homens e mulheres; determina que gênero é binário e decidido biologicamente; determina que pessoas que saiam dessas regras devem ser punidas. A mulher que tenta ocupar um espaço que é determinado masculino; a mulher que é independente; o homem gay; o homem não-branco (porque nunca podemos esquecer que o machismo tem o racismo como seu melhor amigo); a mulher trans*; o homem trans*; todas as pessoas que não se identificam com os gêneros binários. Essas pessoas são vistas pelo sistema como erros que devem ser corrigidos.
O sistema machista determina que mulheres nunca devem se sobrepor aos homens. Que a vontade dos homens é superior, seja na vida pública, seja na vida privada. Em ditos populares como “em briga de marido e mulher, não se mete a colher” e “ele não sabe porque está batendo, mas ela sabe porque está apanhando”, reciclamos constantemente esse meio de vida violento e opressor. Ultimamente, ainda mais com o crescimento das redes sociais, a culpabilização da vítima também tem sido uma ótima arma do sistema. Nunca duvide de uma mulher vítima de violência. Uma vítima de violência doméstica sofre com um ciclo vicioso de violência que a prende ao seu algoz. Dependência financeira, violência emocional e psicológica, violência patrimonial, violência sexual e violência física. É um sequestro de corpo e mente. Olhe o que acontece com ela quando denuncia e pense se essa violência midiática e social é algo que alguém buscaria livremente.
Mas tem outro contexto importante. Luiza Brunet é branca e rica. Ela será atendida em uma delegacia especializada, ao invés de rejeitada e mandada embora. Ela terá onde morar. Ela terá acesso à representação jurídica da melhor qualidade. Até mesmo boa parte mídia tem sido simpática, sem duvidar de sua palavra ou questionar “o que ela fez?”.
Em 2014, de acordo com o Mapa da Violência, foram registradas 223.796 vítimas de violência doméstica. Duas em cada três precisam de atendimento médico por violência física. Ou seja, 405 mulheres por dia foram violentadas por alguém dentro de suas casas, na grande maioria das vezes, seus parceiros. De acordo com os dados do Ligue 180, somente no primeiro semestre de 2015, foram 2.025 atendimentos por dia, totalizando 364.627. Notem que o Mapa da Violência faz uso de dados de denúncias criminais e de atendimentos no SUS. O Ligue 180 serve para orientações que não necessariamente se tornam denúncias. Somente 45,93% desses atendimentos foram encaminhamentos para delegacias. Em mais de 70% dos casos, o agressor era o parceiro; em 39,47%, a violência ocorria todos os dias; em 31,22%, foi percebido um riso iminente de feminicídio.
A violência de gênero acontece todos os dias. A violência doméstica acontece todos os dias e, sem dúvida, acontece ou já aconteceu com você ou alguém que você conhece. Empatia é algo que falta no nosso mundo. Falta olhar para outra pessoa e reconhecer nela uma igual. Alguém que precisa de ajuda. Falta olhar no espelho e ter empatia conosco mesmas. A Luiza Brunet não é uma exceção, ela faz parte da regra. Mas ela terá acesso a coisas que a maioria das brasileiras não têm. Vamos aplicar nossa empatia a ela e todas que estão nessa situação horrenda da violência doméstica. Vamos, homens e mulheres, reconhecer nelas pessoas merecedoras do nosso respeito, amizade e ajuda. Vamos exigir o cumprimento da Lei Maria da Penha, treinamento de policiais, de juízes e juízas, de assistentes sociais, de oficiais de justiça. Vamos exigir rapidez nestes processos, pois uma mulher vitimada pela violência doméstica não pode esperar. Todos os dias que ela deve enfrentar seu agressor, é uma nova violência. Nós precisamos melhorar enquanto sociedade.
Em Belo Horizonte são vários os locais onde você pode denunciar e contribuir para a garantia dos direitos de mulheres em situação de risco ou vítimas da violência doméstica:
Disque Denúncia Nacional (Central de Atendimento à Mulher): 180 (sigilo completo do denunciante)
Disque Direitos Humanos Estadual: 0800 31 11 19 (sigilo completo do denunciante)
Bem-Vinda – Centro de Referência Bem Vinda de Belo Horizonte
Orienta mulheres em situação de risco e, se necessário, encaminha à Casa Abrigo Sempre-Viva . O endereço da Casa Abrigo Sempre-Viva é sigiloso e ela recebe filhos menores de 18 anos.
Rua Hermilo Alves, 34 – Santa Tereza – BH/MG – cep 30.110-060
Telefones: (31) 3277.4379 / 3277.4380 Fax: (31) 3277.9758
CAVIV – Centro de Apoio às Vítimas de Violência Intra-familiar de Belo Horizonte
Rua Espírito Santo, 505 – Centro – BH/MG – cep 30.160-030
Telefone: (31) 3277.9761 Email: [email protected]
NAVCV – Núcleo de Atendimento às Vítimas de Crimes Violentos de Minas Gerais
Rua da Bahia, 1.148 – sala 331 – Edifício Maleta – Centro – BH/MG – cep 30.160-906
Telefone: (31) 3214.1897 / 1898 Fax: (31) 3214.1903 Email: [email protected]
Centro Risoleta Neves de Atendimento à Mulher de Belo Horizonte
Rua Pernambuco, 1.000 sl. 18, 21 e 22 – Bairro Funcionários – BH/MG – cep 30.130-150
Tel: (31) 3261.0696 / 3236 / 4421 Fax: 3261.7971 Email: [email protected]
Conselho Estadual da Mulher
Rua Pernambuco, 1000 – Funcionários – CEP: 30130-150
Horário de funcionamento: 2ª a 6ª de 08h às 12h e 14h às 18h
Telefones: 3261-0696/ 7971
Delegacia especializada de crimes contra a mulher
Rua Tenente Brito Melo, 353 – Barro Preto – CEP: 30190-002
Horário de funcionamento: 8h30 às 18h30
Telefones: 3330-1760/ 1763
Curso Para Capacitação e Geração de Renda Para Mulheres
Rua Pernambuco, 1000 – Funcionários – CEP: 30130-150
Horário de funcionamento: 2ª a 6ª de 08h às 12h e 14h às 18h
Telefones: 3261-0696/ 7971
Centro de Referência em Violência Doméstica e Exploração Sexual
Rua Santo Agostinho, 1271 – Instituto Agronômico – CEP: 31035-490 / Horário de funcionamento: 2ª a 6ª de 8h às 18h
Telefone: 0800-2831244
Coordenadoria Municipal de Direitos da Mulher
Rua Espirito Santo,505, 9º andar,Centro
Telefone: (31) 3277-9758 / Fax: 3277-9754 / E-mail: [email protected]
Disque Cidadã – Central de atendimento às mulheres de Belo Horizonte.
Telefone: 3277-4755 / Atendimento: 2ª a 6ª de 8h às 18h
Cidadania da Mulher
Telefone: 3277-4571
Atendimento/acolhimento às mulheres vítimas de violência doméstica – Pastoral da Mulher Marginalizada de Belo Horizonte
Rua Bonfim, 762, Bonfim
Rua Além Paraíba, 228, Lagoinha
Telefones: 3422-5968/ 3428-8115/ Fax: 3221-8923 / E-mail: [email protected]
Artigo de Larissa Peixoto, doutoranda em Ciência Política pela UFMG, especialista em estudo de gênero
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