Este é o tema do curta/documentário feito por Regina Perillo (jornalista, moradora do bairro e aluna da Escola Livre de Cinema), que aborda, por meio de Jorge, a perda da identidade dessas pessoas, que por diferentes razões fazem do espaço público a sua moradia.
Na entrevista abaixo ela fala sobre o processo de produção do documentário, que contem depoimentos de vários moradores do bairro. Confira:
SST- Você, jornalista, como de repente se tornou cineasta?
RP – Sou formada em Comunicação pela USP, ainda atuo como jornalista e trabalho sozinha. Meu escritório agora é em casa, à Rua Eurita. A mudança ocorreu há dois anos. O fato de fazer 60 anos também mexeu comigo. Era hora de trabalhar menos e ter mais tempo para fazer o que gosto e cinema sempre foi minha paixão, desde mocinha. Soube da Escola Livre de Cinema, pertinho de casa, me matriculei. Eu pensava que era um curso teórico, mas lá a gente coloca a mão na massa. Já fui produtora dos curtas “Linda”, dirigido pela Duda Gamboji e Photofilia, do Gabriel Leal. Na disciplina, Documentário, me senti em casa. É minha praia, até por ser jornalista. Assim propus a filmagem do “Onde está Jorge?”, em que assino roteiro, direção e produção. Acho que o título de “cineasta” está longe e não sei aonde tudo isso vai me levar.
SST- Por que a escolha do tema relacionado ao morador de rua e de Santa Tereza?
RP – Sempre acompanhei a vida dos moradores de rua no bairro. Eles me intrigam e Jorge era um deles. Morou vários anos na Praça Duque de Caxias, boa aparência, parecia estudado, diziam que era dentista. Um dia ele sumiu e fiquei pensando o que tinha lhe acontecido. Perguntei a vários moradores do bairro e cada um dizia uma coisa. Quando sugeri o tema, o pessoal gostou. Fiz uma pesquisa com pessoas que o conheceram, mais de 60 entrevistas. Escolhi nove depoimentos para o filme de uma forma que pudesse trabalhar as contradições e não ficasse repetitivo. Foi o Jorge, mas poderia ser qualquer outro. Serão sempre várias versões. Morador de rua não é “cidadão”. O que me impressionou é que ninguém sabia o sobrenome dele, de onde veio, a família, a profissão, porque foi para a rua, onde está hoje.
SST- Como foram feitas as filmagens, a equipe, quanto tempo durou?
RP – A Escola de Cinema me proporcionou uma experiência muito rica em termos de equipe. Todos eram mais jovens do que eu. Foi muito legal. Cinema é um trabalho de equipe, embora o papel do diretor seja fundamental. Foram quatro meias manhãs de gravação, fora o tempo de pesquisa. A dedicação maior foi na edição e para “montar” o enredo do filme, fiquei dias. Em geral o documentário se constrói é nessa hora, a partir do material gravado. Foi o primeiro, então sei que muita coisa poderia estar melhor, mas foi o que deu para fazer. Eu não sou uma boa diretora, gosto de roteiros, pesquisas etc, mas no final acho que consegui passar a mensagem.
SST- E afinal onde está Jorge?
RP – Tem um monte de gente reivindicando essa resposta. Mas, minha proposta, não foi encontrar o Jorge, e sim mostrar as diferentes versões da comunidade sobre a vida e desaparecimento de um morador de rua. Mas, como conto nos créditos finais, quando as filmagens tinham acabado me avisaram que um morador de Santa Tereza esteve recentemente com o Jorge. Ele me informou que o Jorge está em um abrigo na Pampulha. Não fui atrás ainda, mas pretendo ir. Acho que foi importante manter o suspense para levar á reflexão.
STT – Onde ver o filme?
RP – No youtube, no portal Tatanka Filmes, da Escola Livre de Cinema. Já tive vários convites para exibir o documentário inclusive para moradores de rua. Vou começar a pensar nisso. Mas essencialmente, quero que ele seja exibido aqui em Santa Tereza, pois acho que é a “cara” do bairro.
STT – Quais os moradores do bairro que participam do filme?
RP – Aproveito para agradecer o pessoal que deu os depoimentos e permitiu a construção do filme: Daniel e Daniela do Restaurante Sheridan; o Renato, porteiro; Luis Góes; o Claudio, que foi morador de rua também na época do Jorge, e hoje se recuperou; a Noêmia, alma caridosa; o Urano, taxista do bairro, e o impagável cabeleireiro Bira, uma das figuras folclóricas de Santa Tereza.
Sobre Regina Perillo
Regina é mineira, mãe do Pedro, vó do Pedrinho, casada com o Felix e radicada no bairro há 27 anos. Formada em Comunicação pela Universidade de São Paulo, aos 35 anos trocou São Paulo e o cargo de Chefe da área de publicações, na Telesp, por dois anos em Londres como faxineira, garçonete, ajudante de salão.
Ao voltar, veio para Santa Tereza, montou a Regina Perillo Comunicação, em uma sala à Rua Mármore, atendendo grandes clientes, inclusive o Boulevard Shopping. Há dois anos, levou o escritório pra casa e começou a trabalhar sozinha. Apaixonada por cinema, entrou na Escola Livre de Cinema, pois, segundo ela, “Afinal, sempre é hora de nos entregarmos às nossas paixões. O cinema é meu livro de cabeceira.”