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Patrimônio de Santa Tereza e de BH estão sob ameaça

Patrimônio de Santa Tereza e de BH estão sob ameaça, por Projeto de Lei que tramita na Câmara dos Vereadores

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Stª Tereza é o maior conjunto urbano de BH indicado para tombamento

Texto e fotos: Brígida Alvim

Projeto de Lei que tramita na Câmara Municipal de Belo Horizonte coloca em risco a preservação do patrimônio cultural da cidade. O PL nº 1.255/2014, apresentado pelo vereador Wellington Magalhães, foi aprovado em 1º turno na Câmara e propõe mudanças nas leis de tombamento. Há dois pontos mais polêmicos: o primeiro é a fixação de prazo de 90 dias entre a indicação de um bem cultural, a contar da notificação ao proprietário, e o seu tombamento definitivo pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município (CDPCM-BH); e o segundo é que, caso não haja deliberação final nos três meses, a notificação e o tombamento provisório deixam de vigorar e não poderá ser feita notificação para o mesmo bem no período de um ano.

Rafa Barros defende patrimônio

Rafa Barros defende patrimônio

Especialistas e defensores da preservação pelo Patrimônio Cultural afirmam que tal  indicação de prazo é inviável, por envolver etapas de diagnóstico, levantamento histórico e de documentação, com a atuação de profissionais como arquitetos, pesquisadores e historiadores. Segundo dados da Diretoria de Patrimônio Cultural de Belo Horizonte, atualmente há 1,2 mil processos abertos de tombamento municipal, 288 deles localizados no bairro Santa Tereza.

“É inconcebível que todo pedido de proteção de imóvel que conte com a recusa de seu proprietário possa caducar pela extrapolação do prazo de 90 dias, colocando o bem de valor coletivo maior em risco de descaracterização ou de desaparecimento. O estabelecimento de prazos, caso haja necessidade de fato, deve levar em consideração primeiro a proteção do bem e ainda as condições técnicas que os órgãos competentes possuem para dar efetividade à política patrimonial”, avalia Rafael Barros, antropólogo e mestrando em Preservação do Patrimônio Cultural, que é morador de Santa Tereza, membro da associação comunitária do bairro, a ACBST, e integrante do Movimento Salve Santa Tereza.

Percurso da proposta

Em junho, o projeto de lei foi votado e aprovado em primeiro turno pela maioria do plenário na Câmara e em 1º de julho teve parecer favorável da Comissão de Legislação e Justiça do órgão. No entanto, foram apresentadas seis emendas que deverão ser apreciadas em plenário antes que o projeto original vá a 2º turno.

O vereador Arnaldo Godoy é autor de cinco das emendas que contestam as mudanças nas leis do patrimônio em BH. Segundo ele, quatro protelativas com caráter obstrutivo, para ganhar tempo de discutir o tema com a sociedade; e uma supressiva, em que ele solicita a eliminação dos artigos que referem ao prazo de 90 dias e à suspensão de um ano para o Conselho reapresentar a notificação de tombamento.

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Conselho deliberou pela proteção de Santa Tereza em março/2015

“Os critérios para levantamentos e elaboração técnica de dossiês de tombamento são sérios e complexos, carecem de equipe numerosa e maior tempo de execução. O prazo de 90 dias é muito curto e inviável, não permite a realização de relatórios argumentados e bem fundamentados. Além de comprometer a qualidade dos tombamentos, o PL poderia botar a perder áreas e edificações significativas para a história da cidade e a memória afetiva da população”, avalia Arnaldo Godoy, que integra o Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural de Belo Horizonte.

Ele explica que a última instância de avaliação na qual o PL passará caso seja aprovado em todos plenários e seções da Câmara é a do poder executivo. Nesse caso, o prefeito veta ou sanciona o projeto de lei. “Acredito que ele veta, por ser uma proposta inconstitucional e também por uma questão de coerência com as políticas públicas de patrimônio desenvolvidas no município nos últimos anos, que tornaram a capital mineira uma referência no assunto”, prevê Godoy.

Arquitetos são contrários ao PL

Diante da ameaça de alterações do PL 1254/2014, órgãos ligados às políticas de patrimônio do município e do estado se articulam para combater a proposta. “O IAB-MG (Instituto dos Arquitetos do Brasil), o IEDS (Instituto de Estudos do Desenvolvimento Sustentável) e outras entidades da área vão se posicionar contra essa mudança e estamos contamos com o apoio do ICOMOS-Brasil (Conselho Internacional de Monumentos e Sítios), que é uma ONG ligada à UNESCO que luta pelo patrimônio ao redor do mundo. Vamos denunciar os vereadores que apoiam esse absurdo e tentar impedir a implantação do projeto por todos os meios, inclusive Judicial”, garante Leonardo Castriota, arquiteto urbanista e professor titular da Escola de Arquitetura da UFMG, que atualmente é presidente do ICOMOS-Brasil.

Para ele, a proposta é claramente inconstitucional, primeiramente porque municípios não podem legislar sobre as políticas de patrimônio, uma vez que devem seguir modelos definidos em níveis federal e estadual, que são as únicas esferas aptas a modificar os instrumentos nesse âmbito. “Conforme a Constituição Estadual, o município tem o dever de proteger o patrimônio, com o auxílio da comunidade. O prazo restrito proposto pelo PL tornaria impossível a utilização do instrumento de tombamento e impediria o Município de cumprir um dever constitucional”, argumenta Castriota.

Tombamento em Santa Tereza

Casa de Erli Fantini é indicada para tombamento

Casa de Erli Fantini é indicada para tombamento

Com a aprovação da Proteção do Conjunto Urbano do Bairro Santa Tereza, pelo Conselho Deliberativo do Patrimônio Cultural do Município de Belo Horizonte em março de 2015, foi iniciado o processo de tombamento de 288 bens culturais em Santa Tereza, nos quais se incluem imóveis residenciais e comerciais.

Erline Fantini, artista plástica e ceramista, teve sua casa indicada para tombamento. “Considero a proteção muito positiva por abranger todo o bairro, não só os imóveis, mas também as áreas verdes, as praças, os calçamentos. Por não permitir a construção de grandes prédios, contém o crescimento do número de moradores, pois o bairro não tem estrutura para comportar tanta gente, e assim, tende a preservar a nossa qualidade de vida”, avalia a moradora. Quanto ao imóvel em que reside, possui idade calculada por técnicos em 80 anos. “Entendo que não é possível que o tombamento definitivo seja concluído em três meses, mas espero que não seja tão moroso, para que eu possa usufruir da isenção de IPTU (imposto predial e territorial urbano) e do acesso à leis de incentivo para auxiliar nas despesas com reforma quando forem necessárias”, estima Erli Fantini.

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