O projeto de concessão dos mercados distritais (Santa Tereza e Feira Coberta do Padre Eustáquio) para iniciativa privada, Projeto de Lei 747/2019, será votado pelos vereadores, nesta quinta-feira, dia 12, 15h, em segundo turno. Como o projeto é do executivo (leia-se prefeito Alexandre Kalil), que tem a maioria na casa, é quase que 100% garantida a aprovação.
A aprovação em 1º turno do PL 747/2019, no dia 14 de novembro, autoriza a prefeitura abrir o processo de licitação à privatização dos seguintes locais: Mercado Distrital do Cruzeiro (Centro-sul); Central de Abastecimento Municipal; Mercado Popular da Lagoinha (Centro); Feira Coberta do Padre Eustáquio (Noroeste); Mercado Distrital de Santa Tereza e o 4° andar (laje) do Mercado Novo (Centro).
Para Ilca Moreira, moradora do bairro, ex-diretora da Associação Comunitária (ACBST), integrante do Movimento Salve Santa Tereza e que vem acompanhando a tramitação do PL na Câmara, “embora tenhamos ressalvas com a aprovação do projeto, nele foram apresentadas algumas emendas pelos vereadores Arnaldo Godoy e Pedro Patrus, que mora no bairro, que se aprovadas, têm muito a ver com a luta de Santa Tereza pela preservação do nosso modo de vida. Nas emendas estão retratados alguns pontos essenciais, que casam com nossa luta e com o desejo demonstrado em pesquisas feitas com os moradores pelo Movimento Salve Santa Tereza”.
São pontos, segundo ela, que devem assegurar a convivência que existe entre os moradores. “É Importante lembrar que a luta de Santa Tereza, inclusive a do Mercado, por meio da ACBST, do Salve Santa Tereza com o apoio de muitos cidadãos e cidadãs, que abraçam essa causa, é o que tem preservado o bairro da construção de grandes arranha céus por pressão do mercado imobiliário”, ressalta Ilca.
Algumas das emendas publicadas abaixo batem com o projeto que foi apresentado pelo Coletivo Mercado Verde + Vivo ao prefeito Kalil, dando prioridade à economia popular e à utilização do espaço pelos moradores como lazer.
Emendas
– Os espaços públicos devem garantir as atividade da economia criativa,
economia solidária, produtos agroecológicos e orgânica, priorizando a
agricultura familiar.
– Os espaços serão usados prioritariamente como convivência para a comunidade, em especial atividades culturais e artísticas.
– Criação de um conselho gestor participativo responsável pelas deliberações e diretrizes sobre o uso do espaço, com participação equânime entre a prefeitura, o agente concessionário e os movimentos sociais e comunitário. O Conselho Diretor respeitará as seguintes diretrizes: as características socioculturais de cada espaço; assegurar à comunidade aos movimentos sociais espaços de convivência e lazer;
– O Edital de licitação trará no mínimo as seguintes exigências ao concessionário, para cada espaço: garantir a preservação das atividades típicas dos mercados, priorizando a agricultura familiar, os produtos agroecológicos e das das economias criativa e solidária;
– Garantir e ampliar s usos destes equipamentos públicos como espaços de convivência comunitária, em especial pelo desenvolvimento e atividades culturais, artísticas e de lazer.
– Considerar os aspectos socioculturais e urbanísticos da região do empreendimento e de seu entorno.Criar condições de sustentabilidade do empreendimento.
– Criar condições para expansão da atividade socioeconômica
– Respeitar as políticas públicas definidas para cada local.
1974 – Inauguração com 99 pontos de venda. O mercado viveu seu apogeu nos anos 1970 e 1980.
1990 – desse ano em diante, os moradores de Santa Tereza assistiram a uma operação de desmontagem do espaço pela Prefeitura que não renovava os contratos dos permissionários, à medida em que iam vencendo.
2007 – Fechamento definitivo.
2008 a 2012 – A partir desta data a prefeitura quis instalar a guarda municipal, que foi rejeitado pela comunidade por meio de plebiscito. Teve ainda o concurso pela internet para apresentação de projetos de ocupação, que também não deu em nada. O Mercado continuou fechado, sendo usado como quarto de despejo pela prefeitura.
2013 – O então prefeito Márcio Lacerda entregou, sem consulta prévia à comunidade, o espaço para a Federação da Indústrias de Minas Gerais, para instalar de uma escola profissionalizante para o setor automotivo, atendendo à Fiat Automóveis.
A comunidade ficou dividida uns aprovando para resolver logo a ocupação do espaço e outros preocupados com os diversos impactos negativos que iria trazer ao bairro e especialmente por infringir a ADE, área de Diretrizes Especiais de Santa Tereza. Volta o Movimento Salve Santa Tereza de defesa da ADE, que nesse período busca recuperar o Mercado para a comunidade por meio de manifestações, assembleias, audiência pública, idas ao Ministério Público e abaixo-assinados.
2015 – Tombamento do Mercado pela Diretoria de Patrimônio Histórico. A FIEMG desiste do Mercado e retira-se. O local volta a ser “quarto de despejo” da prefeitura. A partir desta saída a parte externa passa a receber atividades em sua área externa como o Mercado Verde + Vivo, as Feiras de Artesanato, Festival de Música, entre outros eventos.
2016 – O Coletivo Mercado Verde + Vivo (formado por uma rede ampla de entidades, a Associação Comunitária do Bairro, o Movimento Salve Santa Tereza e várias organizações ligadas à agroecologia, à economia solidária, à cultura e ao artesanato) começa a montar um projeto de ocupação do Mercado, baseado nas sugestões recolhidas em pesquisa junto aos moradores.
2017 – O projeto é apresentado ao recém-empossado prefeito Kalil, que se dispôs a ceder o mercado, desde que, dentro de um ano, o grupo apresentasse uma proposta com viabilidade econômica. Durante o ano o projeto foi montado com colaboração do Sebrae.
O projeto
Dentro deste projeto os segmentos de produtos e serviços seriam os seguintes:
Comercial: duas grandes lojas, uma de produtos agroecológicos e uma de artesanato; um supermercado de médio porte; e 54 boxes para venda de produtos diversos;
Serviços: caixas eletrônicos, correios, farmácia, casa lotérica, dentre outros;
Lazer e convivência: cafés, restaurantes e lanchonetes, espaço para atividades físicas, além da praça aberta de livre acesso.
Educação/formação cultural: espaços multiuso para abrigar cursos e oficinas, bem como eventos corporativos ou terceirizados.
Artes: espaço destinado às apresentações artístico-culturais e exposições de arte em geral. Nesse ambiente será abrigado também o Polo de Circo do Mercado, com área para ensaios, apresentações e oficinas circenses.
Gastronomia: espaço para criação de cozinha coletiva, possibilitando a participação de chefs do bairro e de moradores com suas receitas tradicionais.
Além disso a gestão do espaço seria compartilhada entre gestores, permissionários e comunidade, a ser formalizada na constituição da organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que faria a gestão profissionalizada do espaço. Isto para garantir que todos os espaços fossem ocupados considerando aspectos financeiros e mercadológicos, mas também zelando também pelos aspectos técnicos, sociais e culturais.
2018 – No início do ano, o Coletivo Mercado Verde + Vivo tenta reapresentar a proposta final ao prefeito Alexandre Kalil, que informa não poder atender à demanda, pois iria abrir licitação para privatização de todos os mercados distritais da cidade.
2019 – Em 14 de novembro é votado e aprovado em primeiro turno, pela Câmara Municipal, o PL 747/2019.
A história, com idas e vindas e participação da comunidade, chega até aqui. Agora é aguardar o que reserva o futuro para o Mercado. Sendo aprovado o PL 747, que garante ao executivo a concessão do espaço ao setor privado, resta saber qual grupo empresarial irá participar da licitação e vencer a concorrência. Espera-se, que o projeto a ser apresentado respeite as característica do bairro e os interesses dos moradores.
A privatização d irá trazer uma perda imensurável para os usuários do Centro Cultural Padre Eustáquio (CCPE), que funciona em há 11 anos em uma área física que pertence à Feira. A cessão do espaço para a iniciativa privada não exclui o CCPE , pois, o espaço é da Secretaria de Abastecimento e não da Cultura. O seu fechamento gerou grande revolta dos usuários do espaço.
Então há uma proposta fazer outro centro cultural, no Carlos Prates, o que traz um problema, pois os frequentadores são moradores em redor, pessoas idosas e de baixa renda, que vão a pé. Essa mudança inviabilizaria a esses frequentadores utilizar o novo Centro Cultural.
Thais Correa de Morais, aposentada, moradora do bairro e frequentadora do local, denuncia que desativação do espaço cultural privar população das atividades das quais já participa. Só no mês de outubro 2500 pessoas participaram de atividades no local, segundo ela. “Estamos fazendo um abaixo assinado para que o Centro cultural permaneça, mas não é do interesse da prefeitura, que não importa se tem milhares de pessoas sendo prejudicadas”, reclama Thaís.
Ela explica que no local são realizadas festas juninas, bailes de forró, carnaval, ensaios de blocos, oficinas educativas diversas, aulas de dança de salão, forró, yoga, liam gong, violão, além de apresentações de grupos de chorinho, seresta, forró, shows de música como o Viola de Feira, teatro, exibição de filmes, literatura comentada, Encontro de Forrozeiros, exposição de obras de arte, feira de artesanato e brincadeiras para as crianças. Há também atividades voltadas para pessoas idosas, como dança larutan, oficinas de informática, inglês, o tele centro para uso de computadores. E todas as atividades são gratuitas e ministradas por voluntários.
Oficina de dança Larutan gratuita no CCPE
Thaís observa que “não é simplesmente transferir um centro cultural, é um desmonte da cultura popular, uma perda que não se consegue mensurar. A questão é que tem um espaço de cultura que atende uma população imensa na área da cultura, que levou 11 anos para ser construído. A migração para outro espaço, será difícil. A perda para nós será muito grande”.
Matérias relacionadas publicadas nos últimos anos para quem quiser conhecer mais esta história.
Coletivo que defende a reabertura do Mercado de Santa Tereza se reúne com Juca Ferreira
Cultura de BH promete retomar fôlego e fala sobre Cine e Mercado de Santa Tereza
Novo passo para a ocupação do Mercado
Mutirão agroecológico e recreativo no Mercado
Reunião pública discute o Mercado de Santa Tereza
Um dia de atrações no Mercado de Santa Tereza
Prefeito Márcio Lacerda fala sobre o Mercado
Futuro do Mercado de Santa Tereza
Domingo no Mercado de Santa Tereza
Mercado de Santa Tereza: Mutirão e encontro circense
Pesquisa sobre o bairro e o Mercado
Mercado Santa Tereza será reaberto