Coisas de Santê: Jardim dos Pescadores - Santa Tereza Tem
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Coisas de Santê: Jardim dos Pescadores

Texto e imagens: Isa Patto

Uma ação simples voltada para o bem comum é um exemplo de cidadania que o psicólogo Hernany Mendes Pinto e o aposentado Roberto Fausto, conhecido como Vizinho, dão a todos os moradores e frequentadores de Santa Tereza. Os dois amigos cultivam um jardim no muro do Metrô, perto do Bar do Orlando, singelo, que, porém, enche de vida o espaço, antes depósito de lixo.

Hernany Mendes Pinto e Roberto Fausto

Tudo começou em 2012 quando Hernany, Vizinho, Eduardo Garbo e o já falecido Alan Jorge, frequentadores do Bar do Orlando, resolveram montar um bloco de carnaval, o Bloco dos Pescadores, em homenagem à história centenária do bar, que de 1919 até a década de 80, era conhecido como Bar dos Pescadores. Daí o nome do bloco.

No local havia uma estação de trem e, no bar do Luiz Vicente, se vendiam apetrechos de pesca para quem que ia pegar o trem em direção à pescaria nos rios Arrudas ou das Velhas. Por isso virou Bar dos Pescadores. Como há 39 anos pertence ao Orlando e, claro, virou Bar do Orlando.  

Hernany conta que, com o bloco montado, os membros se encontravam sempre no bar para tocar e observaram que no muro havia acúmulo e queima de lixo gerando muita fumaça. “O Garbo, que hoje mora na Bahia, deu a sugestão da gente fazer um jardim de girassóis e nós gostamos da ideia.  Ganhamos as mudas, limpamos, preparamos a terra, colocamos esterco, delimitamos o espaço e plantamos os girassóis. O jardim nasceu no mesmo ano em que montamos o bloco”, lembrou.

Alan (que cuida de jardins no andar de cima) e Garbo regando as primeiras mudas do jardim – Arquivo do Hernany

Depois dos girassóis outras mudas foram plantadas e uma seleção natural aconteceu. Hoje no jardim tem ora-pro-nobis, hibisco, amora, pitanga, plantas ornamentais, boldo, jurubeba, uva, espada de São Jorge, maracujá e jasmim. Hernany lembra que no começo algumas pessoas não puseram fé na ideia do jardim pelo fato de ser um lugar público, perto de um bar, com pessoas sempre passando. “Realmente isso aconteceu, mas nós fomos teimosos, insistimos e hoje o jardim está aí já há sete anos”.

Os primeiros girassois – Arquivo do Hernany

O maior problema é parte do público que vem somente nos fins de semana. Alguns sujam, põem o pé na cerca, jogam lixo. Vamos tentando explicar quando temos oportunidade, contamos a história do jardim e nunca desistimos por causa disso. Todo mundo elogia e gosta da iniciativa, por que o que era um local de lixo virou um lindo jardim”.

Cuidados com o jardim

Atualmente Hernany, Vizinho e o Orlando cuidam do jardim. A maioria dos frequentadores do bar respeita e ajuda no cuidado. E o Orlando entrou na equipe, ajudando na limpeza e sendo o ponto de apoio para quem quiser doar mudas.

Voluntários também colaboram como o Ervália

“Geralmente no fim de semana a gente vem, limpa o local e a pracinha em frente, afofamos a terra, podamos, tiramos as folhas secas e aguamos. Quando a cerca de bambu começa a ficar fraca, vamos até a Mata da Baleia – eles deixam a gente colher o bambu lá – trazemos tudo já cortado e renovamos as cerquinhas. Aqui virou um lugar onde os moradores trazem seus filhos para brincar, os idosos frequentam a academia ao ar livre e muita gente ajuda a cuidar evitando sujar e também doando mudas”.

Coleta de bambu para a cerca, na Mata do Baleia – Foto: arquivo do Hernany

Hernany e Santê

Psicólogo e educador, Hernany é de Pará de Minas. Em 1988 veio estudar em Belo Horizonte e sempre morou por perto, mas só em 2007 é que veio a Santa Tereza. “Aqui, na capital, sempre senti muita falta do modo de vida interiorano. Quando conheci Santa Tereza encontrei tudo de que tinha saudade”.

“Eu comecei a frequentar a boemia daqui, passeava na praça, andava pelo bairro vendo as casas e me identifiquei com esse espírito interiorano. Frequentei o bairro por muito tempo e quando me mudei pra cá, nunca mais saí. Para morar em Belo Horizonte sem ser em Santa Tereza seria difícil. Voltaria para o interior se não pudesse ficar aqui”, confessa.

“Todo cidadão pode dar o exemplo com ações a favor do bem comum”

Ele observa que Santé está cheio de casais jovens, que escolhem o bairro para morar e criar seus filhos com tranquilidade. Um lugar no qual as pessoas se conhecem e se cumprimentam. “Quando saio para dar uma volta, sempre paro para conversar com algum conhecido ou amigo pelo caminho. Aqui a gente existe enquanto ser humano e cidadão. O bairro é uma extensão da casa da gente, é o meu quintal, que eu cuido com muito prazer. Todo cidadão pode dar o exemplo com ações a favor do bem comum e fica aqui minha dica para que todos, de alguma maneira, tomem essa iniciativa”.

Além do Jardim dos Pescadores Hernany trabalha com projetos sociais e atualmente faz parte da Associação do Bairro (ACMBST) e dos movimentos Mercado Livre +Verde e do Salve Santa Tereza.

Ele fala que, como morador e cidadão, está na militância diária para preservação e conservação do modo de vida do bairro. “Sem uma forte mobilização e vigilância permanente, a especulação imobiliária pode conseguir verticalizar Santé. Por isso precisamos trabalhar diariamente e formar sucessores para continuar a luta de preservação do bairro”.

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