Atores de Santê: João Bosco e o outro João - Santa Tereza Tem
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Atores de Santê: João Bosco e o outro João

João Bosco Alves Queiroz, morador de Santa Tereza, 78 anos e 50 de teatro, é uma daquelas figuras, que não sossegam, mesmo quando descansa. Vindo da cidade de Caeté para estudar, adotou Belo Horizonte ainda na adolescência.  Ao mesmo tempo, em que fazia aulas no Teatro Universitário da UFMG, onde se formou em 1969, também fazia o curso de Direito. Mais tarde ainda cursou Administração de Empresas e, para além do teatro, foi funcionário concursado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

No meio desse caminho ele encontrou a Ana Leonel, sua amada para a vida toda, e tiveram dois filhos, Matheus e Daniel. Agora, ele fica babando na netinha Lígia. “Ela chegou em uma hora quando havia me conformado que não seria avô. E é a minha cara”. Além da família, ele tem outras grandes paixões: o palco, a obra do escritor mineiro João Guimarães Rosa e Santa Tereza.

João Bosco e Ana Leonel. Foto: Eliza Peixoto

O palco, a adrenalina, Riobaldo

Agora ele está às voltas, ansioso, com adrenalina nas alturas, com a reestreia do espetáculo O Amor no Grande Sertão, no dia 14 de agosto, no Teatro João Ceschiatti, uma adaptação da obra Grande Sertão: Veredas de Guimarães Rosa. Ele conta que a ideia de interpretar o personagem surgiu quando foi à praia e estava lendo o Grande Sertão Veredas. “Tentei montar um monólogo, mas deixei pra lá. Então, a Ana pegou para si a tarefa e levou dois anos para fazer a adaptação do livro. Afinal são 568 páginas na linguagem do sertanejo. Ela também assumiu a direção da peça, em que o famoso personagem Riobaldo, ex-jagunço, conta de suas dores, fala de seu amor proibido por Diadorim, do pacto com o diabo, de suas dúvidas religiosas e existenciais e das lutas entre os bandos nos vastos campos gerais”.

João Bosco interpretando Riobaldo na peça O Amor no Grande Sertão – Foto: Paulo Márcio

A montagem, que estreou em 2003, foi apresentada tantas vezes, que João já perdeu a conta, mas as reestreias são sempre como se fosse a primeira vez. Além disso, nessa caminhada de 16 anos, muitos fatos marcaram a sua memória. Um deles, foi quando o ator adoeceu com um linfoma fez oito sessões de quimioterapia e 30 de radioterapia em 2006.  O livro fazia parte da lista do vestibular da UFMG e foram vários convites para apresentar em colégios e cursinhos. Apesar da doença, aceitou o conselho do médico, de que o trabalho lhe faria bem. “A Ana ficou muito brava, mas fiz mesmo assim. Nessa época, por causa do tratamento, fiquei careca e acrescentei o chapéu no figurino. Foi um período difícil, mas a Ana cuidou muito de mim e tudo acabou bem. Foram os melhores espetáculos que já fiz”, relata.

Outra passagem foi em Milho Verde, distrito do Serro. Ele conta rindo que “fui apresentar no Bar Cultural da Rita. Quando cheguei ao palco havia um cachorro enorme lá, que não saía de jeito nenhum. Ele então fez parte do cenário e trabalhou muito bem. De outra feita um bêbado sentou ao meu lado e o jeito foi contracenar com ele”.

A história do João ator com a obra do outro João, o escritor, começou há tempos, quando fez uma leitura dramática, ainda na juventude, em uma montagem da diretora Haydée Bitencourt de trechos do livro Grande Sertão: Veredas.

Depois quando encarnou o personagem Manuel Fulô na peça pelos Caminhos de Minas, de Jota Dangelo, sucesso nacional, na década de 70. Dessa peça ele relembra um fato ocorrido no Rio de Janeiro, que lhe rendeu um dedo indicador torto para sempre. “ O Manuel Fulô iria casar com a Das Dor, quando apareceu um bandido na véspera do casamento e queria dormir com a noiva. Manuel foi a uma feiticeira que fechou seu corpo e ele matou o bandido. Nesta cena havia uma luta de facão de verdade, mas cego. Sem querer o ator, que fazia o bandido, acertou sem querer o meu dedo, que quebrou.  O espetáculo não terminou e o dinheiro foi devolvido para o público, enquanto eu ia para o Hospital, onde em vez de um ortopedista que estava em falta no Hospital, fui atendido por um ginecologista. Meu dedo ficou torto para sempre e com problemas de movimento.  Então meu caso com o Guimarães é antigo”, observa.

Como ator João participou de mais de 30 montagens, dirigido por diretores famosos no teatro mineiro como Haydée Bittencourt, Jota Dangelo, Helvécio Guimarães, José Antonio de Souza, Ronaldo Bosch, Eid ribeiro, Pedro Paulo Cava, Kallu Araújo e Júlio Mackense. No cinema participou do longa O Bandido Antonio Dó e do curta O Homem Provisório.  Fez parte de quadros do programa Arrumação, de Saulo Laranjeira e atuou em diversos vídeos educativos produzidos pelo Sistema Salesiano de Vídeo Comunicação e em propagandas na TV.  Foi Ator Destaque nos anos 70 com a peça O Fedor e em 73 com O interrogatório e O contratador de Diamantes. Indicado como melhor ator coadjuvante 98 pelo prêmio Sesc/Sated pela atuação em Dona flor e seus dois maridos e em 2006 indicado pelo prêmio Usiminas/Sinparc pelo monólogo O amor no Grande Sertão.

João e Santa Tereza

O caso de amor com Santa Tereza começou quando ele morava no bairro Serra.  “A gente sempre vinha no restaurante Xanadu de comida capixaba, que funcionava onde hoje é o Sheridan. Depois os filhos ficaram adolescentes e começaram a frequentar a noite Santa Tereza. Já bem tarde eles ligavam para vir busca-los. Então mudamos pra cá para resolver este problema e também porque o bairro é uma delícia com esse ar de interior, onde as pessoas ainda sentam na calçada. Então, na década de 80, ao me aposentar na UFMG, peguei o fundo de garantia e compramos essa casa” conta ele.

João Bosco e Ana na quadrilha do Arraiá de Santê em 2014 – Foto: Eliza Peixoto

Assim, hoje, ele vive cercado de plantas, móveis antigos e quadros, segundo ele, “ onde mais gosto de estar é nesse cantinho e de conviver com meus vizinhos. ” Além de sua casa, João e Ana gostam de sair pelo bairro, especialmente de ir aos bares Bocaiuva e Temático e quando está com preguiça de andar muito vai ao Bolão.

João Bosco na Praça de Santa Tereza – Foto: Eliza Peixoto

João foi presidente da Associação Comunitária do Bairro Santa Tereza (ACBST), eleito em dois mandatos, de 2014 a 2018.  Ele observa q Em 2014, a Associação estava desacreditada e a por termos feito um trabalho sério e comprometido com as demandas apresentadas pelos moradores, eu acredito, que conseguimos restaurar a confiança na entidade. A experiência foi gratificante, pois além de conhecer muitas pessoas do bairro, foram várias vitórias, como por exemplo a volta do posto de saúde para a Rua Anhanguera, junto com a Pastoral da Saúde, a criação junto com o Salve Santa Tereza o projeto do mercado, que está com o prefeito Kalil, o reconhecimento do bairro como patrimônio cultural com o tombamento, entre outras coisas, que às vezes nem sempre aparece para o morador.  No caso do Mercado, as pessoas perguntam porque não está aberto até hoje, mas é um processo demorado e difícil pois envolve o poder público”.

Para quem quiser assistir ao espetáculo O Amor no Grande Sertão, confira as datas e horário:

Espetáculo O amor no Grande Sertão
Data: 14, 15, 16,17 e 18 de agosto
Hora: De quarta a sábado, às 20h e no domingo, 19h
Local: Teatro João Ceschiatti, Av. Afonso Pena, 1537 (Palácio das Artes)
Preço: 30/15 reais

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