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Notícias da Vila Teixeira

Governo reconhece o local como Comunidade Quilombola

Acende-se uma luz no fim do túnel para os moradores da Vila Teixeira, em Santa Tereza, ameaçados por ordem da Justiça. de expulsão das casas, aonde moram há 70 anos.  Hoje, 18/07, foi publicado no Diário Oficial da União o reconhecimento da Vila Teixeira como Comunidade Quilombola.

  O registro foi emitido pela Fundação Cultural Palmares, instituição pública responsável pela emissão de certidão às comunidades quilombolas. Assim, a partir de hoje Santa Tereza passa a contar com a Comunidade Quilombola Souza, a quarta em contexto urbano de Belo Horizonte.

Este reconhecimento reforça a luta dos moradores, que participarão no próximo dia 22 de uma audiência na Justiça sobre a imissão de posse, cuja ação de despejo está marcada para o dia 25 de julho.

Clique aqui e leia a portaria que concedeu a certificação à “Comunidade Família Souza”

Gláucia Cristine em frente à Vila Teixeira

Para Gláucia Cristine de Araújo, líder comunitária das 16 famílias, para os moradores, moradores da Vila Teixeira serem reconhecidos como Quilombo Urbano pela Fundação Palmares lhes traz esperança. “Como quilombo temos alguns direitos, por meio das leis, garantindo a proteção aos remanescentes dos quilombos. Apesar de saber que isso não pode garantir a permanência em nossas casas, acreditamos que, com junto com os documentos de contrato de compra e venda do terreno, registrado em 1923, o nosso direito de propriedade poderá ser reconhecido.

Vila Teixeira é quilombola

A angústia e o sofrimento desta ameaça de despejo fez a nossa família se fortalecer ainda mais. Para defender o nosso direito de moradia, que tem como origem nossa matriarca Dona Eliza, nascida no ventre-livre, e nosso patriarca Petronillo, ex-escravo, buscamos reconstruir nossa história e nos reconhecer como remanescentes quilombolas. De início, esse nome "quilombola" soava duro em nossos ouvidos, pois remetia à escravidão. Mas fomos, aos poucos, entendendo o poderoso sentido desse termo: quilombolas são descendentes da escravidão, que reconhecem seu passado de injustiça e que transformam o presente em luta. Nesta quinta (18), a Fundação Palmares reconheceu nossa família como um remanescente quilombola. Vamos resistir! Viva a Vila Teixeira! Viva o Quilombo Souza, o quarto em contexto urbano de Belo Horizonte! #teixeiraresiste

Posted by Teixeira Resiste on Thursday, July 18, 2019

Como o registro ajuda as famílias

A certidão é peça fundamental na defesa das famílias, já que um dos argumentos apontados pelo juiz do processo de imissão de posse é de que não havia nos autos manifestações ou requerimentos legais que envolvessem a discussão de direitos de cunho social.

O advogado Joviano Mayer, diretor da Associação Comunitária de Santa Tereza (ACBST), que acompanha o processo voluntariamente em nome da ACBST explica o que isso significa.

Segundo ele “a certificação da Fundação Cultural Palmares é questão prejudicial ao cumprimento da ordem de imissão na posse dos herdeiros de Arthur Ramos de Oliveira por força do art. 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias a comunidade quilombola tem direito ao seu território. aos remanescentes das comunidades dos quilombos, que estejam ocupando suas terras, é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos.(art. 68, ADCT).

Ainda, o advogado ressalta que “o interesse social, aliado à necessária preservação do patrimônio histórico e cultural, bem como a concretização da obrigação de garantir o direito à moradia, à memória e a implementação da política pública de interesse coletivo são primordiais e devem prevalecer”.

Sobre as ações que serão ainda desenvolvidas pela ACBST

Joviano Mayer explica que a Associação passou a atuar como assistente nos autos da ação demarcatória, que determinou a imissão na posse e a desocupação do quilombo e que a entidade irá ajuizar ação civil pública, além de entrar com uma Reclamação junto ao Supremo Tribunal Federal para que seja respeitada a decisão da corte suprema na ADI 3239.

Advogado da ACBST Joviano Mayer

Ele ressalta que a desocupação de comunidade tradicional centenária, com a remoção de famílias, cujos ascendentes participaram da construção do bairro de Santa Tereza, patrimônio imaterial da cidade, trará prejuízos e graves consequências à imagem do bairro que é conhecido como um do mais acolhedores da cidade, berço de movimentos culturais, como por exemplo o “Clube da Esquina”. Isso sem mencionar as graves consequências às vidas das famílias que serão desalojadas sem qualquer indenização ou alternativa de reassentamento.

O advogado, que fez um estudo minucioso dos autos acrescenta que “ há irregularidades, ilícitos processuais, violação à ampla defesa e ao contraditório e, inclusive, indícios de fraudes. Assim, é inadmissível a execução da ordem ilegal de imissão na posse em favor dos Autores da ação demarcatória distribuída somente em agosto de 1970, quando os verdadeiros PROPRIETÁRIOS já exerciam posse há décadas, arcando com pagamento de IPTU desde 1952, conforme resposta da Secretaria Municipal de Fazenda (DOC. ANEXO)”.

A participação da ACBST preenche os objetivos estatutários da entidade, que, segundo Joviano Mayer, “se fundamenta nos princípios da solidariedade humana e da justiça social” e deve atuar em defesa dos interesses coletivos do bairro, mormente aqueles que dizem respeito a sua memória e às suas características que fundamentaram a proteção de ordem urbanística e como patrimônio imaterial”.

Audiência na Justiça

Em resposta ao inquérito instaurado pelo Ministério Público Federal e ao pedido da Defensoria Pública de Minas Gerais em favor das 16 famílias da Vila Teixeira, o Juiz Fernando Lamego Sleumer convocou uma audiência para a próxima segunda-feira, dia 22 de julho, com o objetivo de encontrar uma “solução pacífica” para a ação de despejo do terreno na Rua Teixeira Soares. Os quilombolas veem a audiência como uma oportunidade inédita de apresentar os argumentos contra o despejo e de negociar o seu adiamento para que sejam apuradas as irregularidades desse processo.

Histórico

O terreno onde está localizado a Vila Teixeira Soares foi adquirido em 1923 por Elisa de Souza, que nasceu sob a Lei do Ventre Livre, e seu marido Petronillo de Souza, ex-escravo, conforme contrato registrado de compra e venda. O casal veio em 1915 de Além Paraíba, município do interior de Minas Gerais, para Belo Horizonte e trabalharam no abastecimento agrícola do bairro Santa Tereza e na construção da Igreja da Boa Viagem.

Parte da Vila Teixeira na década de 70

O casal comprou o terreno das mãos de Arthur Ramos, dono desde 1905 da antiga fazenda Américo Werneck. Entre 1908 e 1924, a família Ramos vendeu diversos terrenos, incluindo o da Vila Teixeira, mas registrou em cartório a metragem total adquirida em 1905. Devido a isso, Petronillo não conseguiu o registro do seu terreno, mas acreditou estar assegurado pelo contrato de compra e venda. Em 1970, no entanto, os herdeiros de Arthur Ramos iniciaram a ação demarcatória contra vários réus, dentre eles, a Vila Teixeira Soares e o Clube Oásis, localizado no mesmo bairro.

Os moradores da Rua Teixeira Soares foram surpreendidos em 2018 com uma ordem de despejo. A ação, que teve início em 1970, foi suspensa na década de 1980 depois que Lídia Martins, neta de Elisa de Souza, a primeira moradora do local, apresentou os documentos de compra e venda do terreno. Em 2006, o processo voltou a tramitar no Tribunal de Justiça de Minas Gerais sem que as famílias, que pagam IPTU desde 1955, fossem informadas, o que as impossibilitou de tomar diversas medidas jurídicas para impedir o despejo, como, por exemplo, entrar com uma ação de usucapião.

ADE Santa Tereza

A comunidade tradicional da Vila Teixeira, onde habitam 16 famílias, faz parte do Conjunto Urbano de Santa Tereza, ADE – Área de Diretrizes Especiais, aprovado em 1996 pelo município de BH, e das Diretrizes de Proteção de Santa Tereza aprovada pelo Conselho de Patrimônio em 2015, que visa a preservação dos modos de vida e da riqueza arquitetônica, paisagística e cultural do bairro de Santa Tereza.

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